Sem medinho da natureza malévola do ser humano, a miséria é o girino da violência. A miséria quando não mata, une. Se une, o embrião da violência cresce e se desdobra simbioticamente em progressão geoaritimética.
Acordar e ter Taffman E e Yakult na geladeira evita o crime. Ter pão, ovo e queijo minas em casa diminui a ânsia por agressão física.
Defendo então a idéia da auto-regeneração do violento miserável na perspectiva de auto-cura das anomalias geradas pela normalidade rumo a um estado mais autêntico e mais potente em desejo. Da possibilidade de que somos passíveis de escape desta lógica dominante predatória ao desejo...
Geração da própria cura. A cura da opinião, da normalidade e das soluções fáceis partindo da produção de superação da condição de alvo. Superação da miséria de criação, miséria de desejo, miséria de inconformismo, miséria de atitude coletiva e tantas outras co-relações miseráveis.
Como em uma obra de ficção, percebo alterações no modo de operação do sistema social instaurado. Nada de novo, o noticiário relata diariamente estas alterações, seja na notícia propriamente dita, na forma com que se apresenta, sejam nos comerciais... Há que se levá-la em consideração entre uma garfada e outra do jantar, antes da novela.
Estas alterações ultrapassam territórios geográficos, governamentais, culturais e psicológicos. A noção destas alterações se dá pela percepção de falhas dissimuladas recorrentes na configuração social. Conexões veladas, subtextos dominantes, tradições e intenções, informações subliminares que detectadas, passam a assombrar a costumeira perspectiva da vida até onde a vista alcança, os satélites comunicam e as antenas captam.
Alterações que transitaram camaleônicas pelo passado, transitam no presente e transitarão pelo futuro. Assim a noção destas alterações se apresenta como um devir . Devir conspiratório. Fantasmagórico se territorializa e desterritorializa na patologia psicológica paranóia. Confundem-se ocasionalmente.
O devir conspiratório agencia estados de profunda inquietação e inconformismo, provocados pela nítida impressão de que existe um plano, uma lógica invisível regendo a suposta conformidade com o que está posto e assimilado. Suposta porque não está conforme e suposta ainda, porque há uma idéia de que um sistema complexo de subjetividades esteja atuando de fato nesta regência. Neste caso tornar-se-iam insuspeitas as paranóias...
Bem mais lúcidas do que paranóicas, as subjetividades capitalísticas de Guatarri & Rolnick engendram limites na nossa perspectiva de liberdade e impressão de autonomia. As subjetividades capitalísticas definem comportamentos, pensamentos, atitudes, preferências. Definem o amor, o desejo e tudo que se fizer necessário para sua plena permanência. ”É uma subjetividade de natureza industrial, maquínica, ou seja, essencialmente fabricada, modelada, recebida, consumida” .
Eu podia estar roubando, eu podia estar matando mas eu só estou precisando arrumar 5.000 reais...
ANA TIRANA