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domingo, 13 de maio de 2012

Sobre Adaptação e Quadrinhos

Certa vez um senhor que assistiu A Cartomante se levantou no meio da peça e se dirigiu à porta de saída. Abri a porta para que ele saísse, mas sem conter sua indignação o rapaz me falou antes de sair: “Pensei que ia ver Machado de Assis, mas fica só nessas brincadeirinhas!”. E na hora eu pensei e não falei: “Mas as brincadeirinhas são o próprio Machado! O jogo com o leitor... o que será que este moço esperava?”.
Isto me fez refletir muito sobre adaptação e sobre o que as pessoas esperam quando vão ver algo adaptado. Bem, sinceramente eu espero ver o “produto” relacionado a linguagem proposta. Se vou ver uma peça de teatro, adaptada da literatura, não procuro literatura de qualidade, procuro TEATRO. A literatura lida é infinitamente melhor do que qualquer peça, filme ou quadrinho adaptado a partir dela.
Por isso que, nas adaptações tento deixar o purismo de lado e ver de fato a obra. A adaptação deve ser interessante para sua linguagem, não “manter” a linguagem original. Logo, espero uma obra instigante como teatro, como cinema, como quadrinho e não uma obra amarrada e totalmente conservadora com sua fonte, caso contrário eu visitaria a própria fonte. “Dito isto, vamos adiante.” (citando o personagem da peça A Cartomante.).




Ao iniciar o processo de montagem da peça, procurei também as histórias em quadrinhos que criaram como adaptação do conto. E qual foi minha decepção ao me deparar com um trabalho que eu chamaria de no mínimo preguiçoso! O quadrinho foi uma decepção total, um quadrinho que reproduz sem tirar nem por o conto, sem modificar ou experimentar nada da própria linguagem do quadrinho, fazendo até o Maurício de Souza parecer vanguarda.

Não faço apologia aqui de deturpação de obras, por mais que eu seja adepto da máxima de que “autor bom é autor morto”, mas tenho outra máxima interessante: “traduttore, traditore” (tradutor, traidor). O artista adaptador as vezes deve trair o adaptado para que transpareça também sua linguagem de artista, veja bem, não é uma questão de ego, é uma questão de desenvolvimento de linguagem artística.
O quadrinho em questão torna-se tão literal e bobo que não entendo por que não ler o conto original do Machado de Assis, que seria muito mais prazeroso. E sem esta história de que o quadrinho introduz o aluno para a leitura, por isso a transposição de linguagens, então me expliquem por que este volume foi lançado em livrarias com caráter comercial e não apenas nos livros didáticos?
Bem... “Pão ou pães, é questão de opiniães.”, caso você que lê esta postagem tenha uma opinião diferente, ou parecida, compartilhe ela também nos comentários deste blog. Será um prazer pensar mais sobre isto e destrinchar um pouco mais esta história de adaptação de linguagens.




Há pessoas que querem “ver” o autor, mas se esquecem que a obra que estão vendo já passou pelo olhar filtrado de outro artista. Isto me faz lembrar novamente o senhor de que falei no início do texto, até hoje me pergunto: Qual é o Machado de Assis que ele vê e qual é o que ele gostaria de ver adaptado? Isto nunca saberei, afinal o Machado de Assis que eu leio não é o mesmo que você lê nem o mesmo que ele leu.

Um comentário:

  1. Duas palavras resumem todo esse bla bla bla: interdiscursividade contextualizada.
    Simples assim.

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